Costuma-se dizer que “a lota está a tocar” quando a sirene soa para dar início à venda na lota. São 7h00 da manhã quando a venda do peixe começa, mas desde as 6h30 que as portas da Doca Pesca estão abertas para receber o pescado apanhado durante a noite. Em Lagos, o encarregado Pedro Paulino explicou ao Mar d’Estórias que esta lota só faz primeira venda, num horário entre as 6h30 às 11h30 da manhã. Por isso, “se os pescadores não querem perder um dia de mar têm de regressar a terra bem cedo”. Paulino acrescenta, enquanto levanta os polvos da caixa para que os compradores lhes vejam o tamanho, que “a lota daqui difere de Portimão, Sagres e Olhão onde há segundas vendas de manhã e de tarde”.
A lota de Lagos, por ter esta limitação de horário, vive quase em exclusivo dos pescadores locais. No Inverno, esta Doca Pesca conta com cerca de 35 traineiras e com 50 no Verão. Já,“em Sagres, por estar em ponto estratégico, a lota recebe barcos de Marrocos que podem abalar logo. Descarregam, metem gasóleo e não param; mesmo que o barco chegue à tarde podem vender o peixe. Aqui perdem um dia de mar ou dois”.
Pedro Paulino há 38 anos que é encarregado na lota de Lagos, sendo actualmente o funcionário mais antigo, após ter deixado o trabalho de “chofer marítimo em Peniche”. Afirma, nos seus 63 anos de idade, que o trabalho tem de ser organizado com rigor todos os dias: “tanto o vendedor como o comprador de peixe têm de estar autorizados e no sistema. Só assim é possível que, no fim da venda, o pescador receba o bilhete no qual conste tudo – preço por quilo e tipo de peixe associado ao código do seu barco”. Não descurando as limitações da captura de peixe, de acordo com as épocas e do tamanho do barco: “O Vagabundo (nome de um barco) de 9 metros, só pode apanhar 1.500kg sardinha por dia.”
Também o sistema do leilão da Doca Pesca tem o seu preceito, menciona o encarregado: “Quando arranca a venda,os preços já estão definidos de outras lotas; depois faz-se um acerto a nível geral. O valor sai para venda com 40% a mais para dar espaço de manobra ao comprador. E vai-se ajustando o preço sucessivamente de acordo com o valor que é comprado”.
Então como é que efectivamente funciona a lota? Em termos latos, aos pescadores cabe-lhes descarregar a apanhado dia, dividir por tamanho e fazer deslizar as caixas na passadeira. Aos compradores basta-lhes perceber quanto é que estão dispostos a pagar e carregar no pequeno botão do comando que têm nas mãos, para adquirir ao preço que surge no ecrã: “os compradores nas cadeiras é que atribuem o valor que querem dar pelo peixe. Quando carregam no botão os preços param e esse fica o valor do peixe. A caixa seguinte terá um acréscimo de 40%”, explica Pedro Paulino.
A vida de um pescador não é apenas levantar cedo, domar os humores do mar alto e desembaraçar as redes para deixar tudo pronto para a próxima ida ao mar. Existe inclusive, entre os pescadores, a expressão “Deus queira que compres um barco”, que pode parecer uma bênção, mas que é utilizada como uma praga. Na realidade aquele que compre um barco para a lide das pescas acaba por “comprar” preocupações associadas à manutenção do barco e das vontades do mar. O pescador respeita o mar e respeita as regras da venda do peixe, em leilão, para garantir o sustento da família: “o ano passado, por esta altura os salmonetes estavam as 15€, hoje vendi-os a 9€”,menciona um dos pescadores que estava a vender na lota. A verdade é que apesar de tudo a lota é um facilitador para estes pescadores. De alguma forma está definida com regras e procedimentos para que a aproximação entre os intervenientes seja eficaz e mais simples, tanto para os homens do mar, como para aqueles que querem o peixe mais fresco.