Podíamos pensar várias coisas duma mulher que olha para a escultura com uma curiosidade primitivista, que vê nas formas e formatos da realidade o seu contexto arqueológico inerente. Podíamos pensar numas mãos gastas e ríspidas, num olhar sério e imbuído, num porte cansado.

A pessoa que se debruça sobre a relação entre a mão e a matéria e que encara a escultura como a sua «forma de comunicação privilegiada», aparece-nos com uma leveza, jovialidade e simplicidade que ecoam na mente de quem a lembra ou recorda.

Com o início de um percurso académico nos terrenos da arquitectura, cedo lhe foi sendo sugerido que a escultura seria onde ia encontrar a expressão do seu talento. Acabou por se transferir para a Faculdade de Belas Artes, (também) da Universidade de Lisboa, concluindo, em 2005, a licenciatura em Artes Plásticas. É doutorada em Escultura desde 2014, o que, segundo um professor de curso citado nesta entrevista mais do que uma vez, representava «a perda de uma arquitecta em prol do ganho duma escultora».

Em 2006, Sara Navarro admite ter tido o primeiro contacto com a arqueologia, no seguimento do seu estágio profissional enquanto técnica superior de artes plásticas, no Museu de Portimão. «Tinha ficado encarregue de uma réplica arqueológica com finalidade educativa. Deste episódio, recordo vivamente o momento em que tive a oportunidade de segurar com as minhas mãos uma pequena representação antropomórfica do calcolítico [período entre o neolítico e a idade do bronze]», conclui a escultora, que diz aperceber-se, volvidos dez anos, de que esse momento marcou todo o seu percurso subsequente.

Foi assim que acabou por dar um rumo à sua investigação de doutoramento, ao longo da qual se debruçou sobre a produção cerâmica no período neolítico português. «Manipular um objecto proporciona uma forma de conhecimento particular, mais próxima e muito mais profunda do que a decorrente da sua visualização através da vitrine de um museu».

Ainda que o seu percurso profissional se tenha desenvolvido entre a criação, o ensino e a investigação, é com esta última que a escultora melhor se identifica e onde diz haver uma maior transdisciplinaridade, que «cria espaço para a produção artística e para a reflexão científica, reunindo iniciativas de várias áreas de pesquisa, como a escultura, a arqueologia e a museologia».

Foi com a mesma leveza, jovialidade e simplicidade do dia-a-dia, que a artista plástica e escultora Sara Navarro montou o seu ensaio fotográfico “Do Magma às Estrelas”, na galeria de eventos do Mar d’Estórias. Desde o momento em que foi colocado o primeiro vinil na parede, até ao dia em que a exposição abriu as portas ao público, o sorriso da escultora manteve-se rasgado e a energia positiva pairou naquela sala de tecto em caixão, onde se pode agora encontrar um “laboratório experimental de investigação”, em que as peças expostas estão suspensas por um fio e são «separadas do próprio contexto de origem», convidando à «contemplação e ao pensamento».